Evento nas ruínas da Igreja do Rosário dos Pretos celebra cultura afro-brasileira e resistência em Natividade durante o Novembro Negro no Tocantins.
O encontro reuniu servidores da Secult, representantes de secretarias estaduais e municipais, além de coletivos culturais e comunidades locais. A programação incluiu roda de conversa e apresentações de grupos de suça, reforçando o papel da cultura negra como instrumento de resistência e valorização identitária.
Ancestralidade e saberes populares
A mestre suceira Dona Felisberta Pereira, do grupo Suça Mãe Ana, abriu os momentos de fala com palavras de sabedoria e orgulho:
“Cultura é rezar, cantar, dançar e mostrar o que temos de bonito. Isso é resistência. Mesmo quando dizem que essa dança é coisa de negro, nós respondemos com orgulho: é sim, e é linda”.
Ela destacou a medicina caseira como parte fundamental da herança afrodescendente em Natividade: “As garrafadas, os xaropes e o rapé são formas de saber ancestral que nos curam e conectam aos nossos antepassados”.
O líder do grupo Catireiros de Natividade, Seu Belarmino Romão Ferreira, reforçou que a catira é mais que dança — é educação e consciência ambiental. “Todas as minhas composições falam sobre a natureza e a preservação da fauna e da flora. A cultura também educa e nos faz lembrar de onde viemos”.
Juventude e pertencimento
A jovem Iara Santana Rocha, de 13 anos, do grupo Suça Tia Benvinda, emocionou o público ao relatar sua relação com a dança:
“Quando danço, me sinto alegre e em paz. É o meu jeito de ser feliz. A suça é parte de mim”.
A professora Verônica Tavares de Albuquerque, responsável pelo Ponto de Cultura Tia Benvinda, explicou que o trabalho com as crianças vai além da dança.
“Cada verso e cada sapateado contam a história do povo sertanejo. Aqui ensinamos o significado da manifestação, para que cada geração compreenda o poder e o valor da cultura afro-brasileira.”
Falas de reconhecimento e resistência
Durante a roda de conversa, o superintendente de Fomento e Incentivo à Cultura da Secult, Antônio Miranda, destacou o protagonismo das comunidades tradicionais:
“Quem tem o conhecimento são vocês. O papel do governo é ouvir e aprender com os verdadeiros mestres da cultura”.
O secretário municipal de Cultura e Turismo de Natividade, Justino Pereira, relembrou o legado afrodescendente da cidade:
“A nossa cidade foi construída pelas mãos de pessoas negras. A suça é símbolo disso. Celebrar o Novembro Negro aqui é reconhecer nossas raízes”.
O diretor de Fomento e Proteção da Cultura Afro-Brasileira da Secretaria de Igualdade Racial (Seir), Ênio Sales de Oliveira, alertou sobre a necessidade de políticas permanentes:
“Não basta celebrar em novembro. É preciso garantir políticas contínuas de valorização da cultura afro-brasileira, como prevê a Constituição nos artigos 215 e 216”.
Mulheres e memória viva
A secretária-executiva da Secretaria da Mulher, Warner Macedo Camargo, lembrou que as ruínas são guardiãs da memória e da dor do povo negro:
“Essas pedras guardam histórias de vidas e sacrifícios. Reconhecer isso é também lutar contra o esquecimento. Natividade é símbolo da resistência negra no Tocantins”.
Também participaram da mesa a gerente de Convênios e presidente da Comissão de Editais da Política Nacional Aldir Blanc (PNAB), Simone Moura; a presidente da Associação Cultural de Natividade (Ascuna), Simone Camelo; e o professor e escritor Wátila Misla.
Da Secult, marcaram presença o gerente de Desenvolvimento da Cultura, Luciano Pereira, e a gerente de Fomento e Parcerias Culturais, Savana Sanches.
Encerramento com dança e devoção
O evento encerrou com as apresentações dos grupos Tia Benvinda e Mãe Ana, que uniram gerações em uma roda vibrante de suça.
Sob a Bandeira do Divino e ao som dos tambores, crianças, jovens e adultos dançaram em celebração à ancestralidade.
O momento final, marcado por orações e cânticos, expressou o pertencimento e a fé que movem o povo nativitano e reafirmou o compromisso com o combate ao racismo e a valorização das tradições afro-brasileiras.
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