Quando a desculpa vira álibi e a Justiça vira seletiva

Caso Dhemis expõe seletividade da Justiça brasileira

caso Dhemis e a seletividade da Justiça brasileira

O caso Dhemis reacende uma das feridas mais profundas do Brasil: o modo como a Justiça trata de forma desigual réus brancos e réus negros. O vigia Dhemis Augusto Santos, de 35 anos, foi assassinado a tiros após uma discussão sobre estacionamento irregular em um shopping de Palmas. Ele foi sepultado em Siriri, Sergipe, enquanto sua família enfrenta a dor de perder um trabalhador negro em uma situação absurda e violenta. Mesmo diante de tamanha brutalidade, o Judiciário parece mais uma vez inclinado a suavizar a responsabilidade do agressor.

Caso Dhemis e o discurso do “surto” que sempre beneficia os mesmos

A nova etapa do caso Dhemis trouxe revolta adicional. O acusado, foragido, declarou ser “mecânico” e, segundo seus advogados, estaria “arrependido”, alegando ter agido em um “surto por força de medicamentos”. O argumento ecoa um padrão histórico: quando o réu é branco, constrói-se rapidamente um caminho de empatia, justificativas emocionais e diagnósticos tardios que tentam amenizar o crime. Esse roteiro é antigo, previsível e profundamente injusto.

Quando a vítima é negra e o agressor é branco, surgem explicações que buscam humanizar o autor da violência. Surto. Remédio. Instabilidade. Estresse. Falta de controle momentâneo. Mas, quando o réu é negro — mesmo com histórico real de transtorno mental — sua humanidade raramente é reconhecida. A resposta estatal costuma ser rígida, automática e desprovida de cuidado, refletindo desigualdades que atravessam décadas.

caso Dhemis e as duas velocidades da Justiça no Brasil

Esse contraste não é teórico. É concreto. Está nos presídios lotados, nas audiências de custódia, nas perícias psiquiátricas que chegam rapidamente para uns e nunca chegam para outros. O Brasil opera duas engrenagens jurídicas: uma sensível, compreensiva e cheia de nuances para determinados grupos; outra dura, imediata e desumanizadora para aqueles que já nascem marcados pelas desigualdades raciais.

Dhemis não teve direito a defesa.
Não teve direito a arrependimento.
Não teve explicação.
Não teve segunda chance.
Teve apenas sua vida interrompida durante seu trabalho, de maneira brutal, em um episódio que jamais deveria ter acontecido.

E agora, seu algoz pode vir a receber do Estado aquilo que o Estado não ofereceu ao trabalhador negro que perdeu a vida: um olhar humano.

caso Dhemis e a pergunta que o Brasil precisa enfrentar

O Brasil precisa se perguntar, com honestidade e urgência: até quando a narrativa do “surto” será utilizada como álibi para suavizar homicídios cometidos por homens brancos contra homens negros? Até quando aceitaremos que sintomas, arrependimentos e justificativas medicamentosas sejam usados para relativizar assassinatos, enquanto milhares de negros com transtornos reais seguem presos, abandonados e invisíveis?

O direito de defesa é constitucional.
Mas o direito de continuar vivo é ainda mais fundamental.
E Dhemis Augusto Santos teve esse direito arrancado de forma definitiva.

Se a Justiça não reconhece essa assimetria brutal, ela falha em seu propósito. Não promove igualdade. Não garante isonomia. Apenas perpetua privilégios.

Nenhuma democracia que se respeite pode permitir que a cor da pele defina o tratamento jurídico de um cidadão. O caso Dhemis não é apenas sobre uma tragédia individual. É um espelho doloroso de um país que ainda não aprendeu que justiça seletiva não é justiça. É omissão. É complacência. É desigualdade institucionalizada.

Enquanto o Brasil não enfrentar essa verdade, novos casos como o de Dhemis continuarão a ocorrer — e continuarão sendo sintomas de uma estrutura que insiste em negar valor igual às vidas negras.

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