Couro com alma: Patricia Vieira e a arte de escutar com as mãos

Se o avesso de Walério Araújo foi grito, Patricia Vieira chegou como sussurro firme. Firme como as mãos de quem corta, cose, passa. Ela é daquelas designers que não largam o ateliê para ver a moda acontecer — ela faz acontecer. Com os ouvidos atentos às vontades da mulher que veste sua marca, Vieira entrega desejo com precisão milimétrica e, claro, acabamento impecável.

Na SPFW N59, a estilista mostrou que o couro — sim, o couro! — pode ser tão delicado quanto a seda, tão fluido quanto a renda, tão leve quanto a intenção. Vestidos que seguem o corpo, em tons de marinho, bordô e metalizados, caminharam ao lado de smokings e pantalonas com um “quê” de provocação sutil. A sensualidade está no corte, não na obviedade.

Mas o grande charme da temporada? A inesperada visita do Art Déco, em losangos cortados a laser, montados como quebra-cabeças em conjuntos de camisa e saia lápis, trench coats e peças que desafiam a lógica da matéria-prima. Cada fragmento de couro que sobra vira textura, vira arte, vira narrativa. É o design como ecologia e elegância.

Desde 2017, a grife segue com o programa Zero Waste, em que o couro é aproveitado integralmente — da meia-lua ao coração da peça. Desta vez, os holofotes também brilharam sobre a parceria com o artesão cearense Jardel Moura, que inseriu suas rendas richelieu no couro com tanta delicadeza que beirou a poesia.

E como em toda boa história de amor à moda, teve noiva sim — vestida de couro, é claro. Uma noiva moderna, urbana e autoral, que encerrou o desfile com a força silenciosa de quem sabe: Patricia Vieira não segue tendências. Ela constrói legado.

🖋️ Por Jaciara Barros – onde o couro é leve, e a moda tem memória

Fotos: Agência Fotosite